Entender a composição e o tamanho de um fenômeno da educação brasileira e pôr a questão entre as prioridades do poder público. Lado a lado com a democratização do acesso à escola nos últimos anos, um problema surgiu, de forma sutil, mas tomou uma proporção que acendeu o sinal de alerta. Especialistas e representantes da sociedade civil e do governo federal e de alguns estados debateram, durante dois dias, na capital paulistana, a crise no ensino médio.
Atualmente, apenas 50% dos alunos matriculados na primeira série concluem os três anos de ensino. A principal pergunta é: o problema reflete uma crise ou põe em xeque o próprio modelo de educação adotado no país? O seminário, promovido pelo Instituto Unibanco, terminou na sexta-feira e lançou um desafio: é preciso encontrar as causas para dar as soluções e mudar as metodologias de análise e avaliação em vigor. E levantou outra condição: não se pode pensar no ensino médio sem voltar os olhos para a educação fundamental.
Os dados do censo escolar de 2007 do Ministério da Educação (MEC) mostram que, dos 3,6 milhões de jovens que se matriculam no ensino médio, apenas 1,8 milhão deles concluem esse nível. A taxa de abandono (estudantes que deixam de freqüentar as aulas) é de 13,3%, contra 6,6% verificados de quinta a oitava séries e 3,2% da primeira à quarta série. O evento foi idealizado com base na observação do cotidiano de 126 escolas de cinco estados, entre eles Minas Gerais, e dois projetos presentes em instituições de Belo Horizonte e de Juiz de Fora, na Zona da Mata. ?É difícil relacionar as causas, mas observamos que esses problemas estão tirando os meninos do mercado de trabalho. Temos um dever de casa enorme para fazer se quisermos entender e interferir nesse fenômeno?, afirmou a diretora-executiva do Instituto Unibanco, Wanda Engel.
O presidente do Conselho Consultivo do Colégio Pitágoras, Cláudio de Moura Castro, um dos palestrantes do evento, ressaltou que, há 20 anos, o acesso ao ensino médio se limitava a 20% dos estudantes. Ao longo da década de 1990, esse quadro mudou. ?Universalizou-se o acesso e a permanência. Agora, todos estão na escola, mas atrasados, e aprendem muito pouco. Aos 14 anos, se inicia o processo de abandono. Com 17, ainda há muitos na escola, mas cursando o ensino fundamental. Em algum momento, 80% se formam no fundamental, mas metade já entra no médio fora da idade e, desses, entre 40% e 50% apenas chegam ao fim?, disse.
O pesquisador do Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea) Ricardo Paes de Barros apontou uma série de fatores que podem ser os responsáveis pelo quadro: os jovens não estão interessados pela educação; o país oferece poucas oportunidades aos estudantes; há crise de oferta e de aproveitamento das chance (as escolas existentes são usadas aquém do esperado, pois o jovem é pobre, tem dificuldade em arcar com o transporte no deslocamento até o estabelecimento de ensino e precisa trabalhar). Por outro lado, de acordo com ele, a própria juventude repele a sala de aula, por causa do desinteresse pela educação, má qualidade das instituições de ensino e inadequação do sistema ao que os alunos precisam (enquanto eles querem e precisam trabalhar, o sistema os prepara para o vestibular).

Dificuldades
A secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, disse que o ministério reconhece o problema, que é complexo. ?As políticas das últimas duas décadas ampliaram o direito à educação, mas estamos num país que não cumpriu a agenda dos séculos 18, 19 e 20. Teremos de fazer tudo agora. Além disso, os meninos de hoje estão no auge das descobertas e a escola de 2008 tem o formato dos anos 1960?, relata.
Segundo ela, dos 10,646 milhões de adolescentes na faixa dos 14 aos 17 anos que estão na escola, quase 5 milhões têm renda de meio a dois salários mínimos per capita. ?O menino com dor de dente e frio aprende menos com isso. É preciso pensar nessa diferença. A exclusão escolar tem classe e cor: jovens pobres e negros são os primeiros a sair da escola?, acrescenta.
A necessidade de reformas no conteúdo também foi destacada pela secretária de Estado de Educação, Vanessa Guimarães Pinto. Ela chamou a atenção ainda para a falta de estrutura, de professores, de carreira docente e de piso para investimentos. Ela destaca que Minas tem índices estáveis e abaixo da média nacional, embora preocupantes. Os últimos dados, de 2005, mostram que as escolas da rede estadual têm 13% de evasão (alunos que não se matriculam no ano seguinte) e o mesmo percentual de abandono (estudantes que deixam ir às aulas).

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