Produtos de consumo do dia a dia dos brasileiros, como cosméticos, formulações farmacêuticas e embalagens, podem ser responsáveis pelo desequilíbrio hormonal infantil no país. Pesquisadores da Universidade Federal do ABC (UFABC São Paulo) – ligada à USP – descobriram que as crianças brasileiras estão expostas a determinadas moléculas presentes nesses materiais que podem favorecer o aparecimento de problemas como puberdade antecipada, câncer, diabetes e infertilidade na fase adulta. O resultado foi publicado na revista científica “Environmental International”.

Os especialistas analisaram 300 amostras de urina de crianças entre 6 e 14 anos das cinco regiões do país. Eles constataram que essa parcela, principalmente as meninas, está exposta a níveis altos de parabenos e benzofenonas, duas classes de disruptores endócrinos – um tipo de molécula que não é sintetizada de forma natural no organismo e que pode alterar o equilíbrio hormonal – presentes em cosméticos e outros produtos de uso pessoal.

Os números nacionais, quando comparados aos de outros países, tornam-se preocupantes. A quantidade de benzofenonas em crianças brasileiras (57,3 nanogramas por mililitros – ng/mL) foi de duas a três vezes maior do que a relatada nos pequenos da Alemanha (33,6 ng/mL) e dos EUA (33 ng/mL), por exemplo. Quanto aos parabenos encontrados por aqui, o número é de 110 ng/mL, enquanto que na Dinamarca é de 69 ng/mL e, na Alemanha, 57,2 ng/mL.

“Essas substâncias provocam o aumento ou a diminuição da produção de hormônios. As crianças, por ainda não terem um sistema hormonal totalmente formado, são as que mais sofrem com os impactos, já que o balanço na produção de hormônios é fundamental para o desenvolvimento saudável”, explica o pesquisador Bruno Alves, um dos participantes do estudo.

Segundo Alves, o maior objetivo da pesquisa é mostrar aos órgãos regulamentadores os riscos dessa exposição. “Os dados são muito graves. Se lembrarmos que o Brasil é um dos países que lideram o ranking de venda de cosméticos, o impacto em longo prazo pode ser desastroso”, alerta o especialista.

Para garantir resultados mais consistentes, o próximo passo é ampliar o alcance do experimento. “Até o fim do ano, outro projeto será entregue para aprovação e obtenção de recursos pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para, então, executá-lo”, diz Alves.

 Método utilizado é mais abrangente

Normalmente, esse tipo de estudo utiliza testes estatísticos relativamente simples, comparando individualmente cada substância a um ou poucos parâmetros, como idade ou região. Mas, nesse caso, além de fazer isso, os pesquisadores realizaram uma análise de “mineração de dados”, que permitiu avaliar os efeitos da exposição simultânea a vários disruptores endócrinos.

“Quando você joga todos os dados de uma vez (na análise estatística), você avalia a coexposição. Ou seja, a pessoa não está exposta a determinado parabeno, mas a vários tipos de parabenos, aos bisfenóis, e assim por diante”, ressalta o pesquisador Bruno Alves.

“Numa somatória, com certeza, isso tem efeito. E mostramos isso no nosso trabalho, que a coexposição é algo a ser levado em conta”, afirma.

 

Fonte: O Tempo ||

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