Uma série de reportagens do jornal Estado de Minas denuncia o esquema usado por boa parte dos deputados estaduais mineiros para justificarem os gastos mensais com verba indenizatória de R$ 20 mil para custeio do mandato.
Assim, os parlamentares estão despejando todos os meses na contabilidade da Assembleia Legislativa de Minas Gerais um grande volume de notas fiscais frias para justificar os gastos. Segundo as reportagens do Estado de Minas, desde 2001, depois que tiveram de cortar seus salários de até RS 90 mil, os deputados têm direito à verba indenizatória, mas só recebem o dinheiro se apresentarem o comprovante da despesa. Por isso ocorre a farra das notas frias.
Apenas uma empresa, registrada como Máxima Comercial Ltda., recebeu R$ 685,7 mil entre julho de 2009 e janeiro deste ano para produzir boletins informativos de 13 deputados. A empresa funciona em uma pequena sala na entrada de uma garagem em um bairro residencial de Contagem, sem ter sequer uma máquina de impressão, ela embolsou 82% do valor (R$ 561,6 mil), pois pagou apenas R$ 124 mil a uma gráfica terceirizada para produzir o material.
Os deputados que transferiram recursos à Máxima, segundo a reportagem, são: Adalclever Lopes (PMDB), Hely Tarquínio (PV), Chico Uejo (PSB), Antônio Júlio (PMDB), Gilberto Abramo (PMDB), Sávio Souza Cruz (PMDB), José Henrique (PMDB), Delvito Alves (PTB), Juninho Araújo (PTB), Doutor Rinaldo (PSL), Mauri Torres (PSDB), Eros Biondini (PTB) e Fábio Avelar (PSC).
No total, 2,1 mil empresas emitiram 11.039 notas para deputados mineiros nos sete meses analisados pelo jornal Estado de Minas, com base no portal da transparência da Assembleia Legislativa. Foram gastos R$ 8,7 milhões com verba indenizatória neste período.
Na denúncia, foram relatados episódios com fortes indícios de uso indevido de recursos públicos, como a indenização por notas que apresentam numeração seriada, e também com fraude confessa.

Abusos
A série de reportagens começou a ser publicada no domingo (18) e mostra os abusos cometidos por pelo menos 51 dos 77 deputados mineiros. Os documentos despertaram suspeitas sobre quase duas centenas de empresas, pelos valores pagos ou pela relação entre os deputados e os proprietários das firmas, dentre outros aspectos.
Como denuncia uma das reportagens, uma resolução da mesa diretora da ALMG limita os gastos com combustível, consultoria e aluguel de veículos em até 25% da verba, cada, mas não faz qualquer restrição ao uso para divulgação da atividade parlamentar. Por isso, 95 das 98 notas com valores maiores que R$ 10 mil foram apresentadas para justificar supostas despesas com divulgação. As gráficas receberam R$ 3,58 milhões nos sete meses analisados, o que corresponde a 41,4% do total. Em seguida vêm os postos de combustível, R$ 1,68 milhão (19,5%), e supostas empresas de consultoria e assessoria parlamentar, R$ 1,32 milhão (15,3%).
Ainda conforme a reportagem, de 57 deputados que receberam mais de R$ 100 mil, cada, nos sete meses de análise, a título de verba indenizatória, pelo menos 41 apresentam algum indício de abuso na prestação de contas. Procurados, os deputados disseram desconhecer qualquer irregularidade.

Conheça o esquema
O próprio fornecedor das notas frias revelou o nome de alguns parlamentares envolvidos no esquema. A reportagem do Estado de Minas se passou por assessor parlamentar e Washington Marques de Almeida, de 51 anos, revelou o esquema. Ele mantém a sede de sua ?gráfica? no segundo andar de uma casa simples, com acabamento de reboco, na Cachoeirinha, na Região Nordeste de Belo Horizonte. Em vez de máquinas e papel, no local há roupas espalhadas por todos os cantos. Ele diz que a filha mantém uma loja de roupas e calçados ali.
Sem saber que era gravado, Washington ofereceu notas fiscais ao repórter do Estado de Minas, que o procurou dizendo estar interessado em fazer um jornal para um parlamentar. Como entregou, o esquema seria fazer ?cinco mil jornalzinho (sic) e tirar a nota de R$ 50 mil?. Os documentos fiscais são emitidos em nome da empresa cuja razão social é seu próprio nome, mas também pela Artes Gráficas GSM, que funciona a 500 metros de sua casa, numa loja onde há apenas dois computadores.
Entre julho de 2009 e janeiro de 2010, as duas empresas emitiram 18 notas que totalizam R$ 167,4 mil, o terceiro maior valor registrado com base nas prestações de contas dos parlamentares.
A série de reportagens do jornal Estado de Minas mostrou também que gráficas que receberam nos últimos meses recursos oriundos da verba indenizatória da Assembleia Legislativa de Minas Gerais já fazem uma espécie de ?caixinha? para bancar gastos dos deputados na campanha de 2010.
Sem saber que eram gravados, os donos de duas empresas que estão entre as que mais receberam dinheiro público a título de divulgação parlamentar admitiram que os deputados já adiantam o pagamento de despesas das eleições de outubro, o que contraria a legislação eleitoral. Há indícios de que parte da verba da Assembleia seja usada para este fim.

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