Senhores:

Em abril de 1997, com apoio do Banco Mundial e da União Para Conservação Mundial, grupos representando diversos interesses, se reuniram em Gland – Suiça – por ocasião da publicação de um recente relatório elaborado pelo Banco Mundial, para discutirem questões altamente controversas envolvendo grandes barragens.

O workshop contou com a presença de 39 participantes de governos, do setor privado, de instituições financeiras internacionais, de organizações da sociedade civil e de representações das populações afetadas.

Uma das propostas resultantes do encontro foi que todas as partes trabalhassem juntas para se estabelecer a Comissão Mundial de Barragens (CMB) com mandato para:

• Examinar a eficácia das construções de grandes barragens;

• Elaborar critérios, diretrizes, padrões internacionalmente aceitáveis para o planejamento, projeto, avaliação, construção, operação, monitoramento, multiuso das águas e descomissionamento de barragens.

• A CMB, era independente, com cada membro participando com sua capacidade individual, não representando nenhuma instituição ou país.

• Iniciou seus trabalhos em maio de 1998.

• Seu encerramento na América do Sul, se deu em novembro de 2000, com a apresentação do relatório “Barragens e Desenvolvimento – Um Novo Modelo para Tomada de Decisões” – em solenidade presidida pelo professor José Goldemberg – membro da Comissão, em evento no Instituto de Eletrônica e Emergia da Universidade de São Paulo.

• A Comissão foi presidida pelo professor Kader Asmal, ministro da Educação da África do Sul e composta por outros 11 ilustres professores representando a Índia, Filipinas, Estados Unidos, Suécia, Alemanha e Austrália.

Pois bem senhores, este jornalista, convidado que foi para participar do evento, não poderia perder a oportunidade de trazer a público os crimes que ocorriam aqui no nosso Lago de Furnas, esvaziado propositalmente, à época por questões políticas – rixa entre FHC e Itamar Franco, que foi resolvida meses depois, com a corajosa investida do governador de então que colocou boa parte da Polícia Mineira junto da barragem, prometendo fazer com que o pouco de água restante no lago, se preciso fosse, viesse a escoar para o São Francisco, com derrubada do dique de Capitólio.

Mas, deixando estas firulas históricas de lado, voltemos ao que ali falei, resumidamente, em defesa de Minas: 

É na condição de presidente do Codema e de diretor da Federação Brasileira de Jornais, que mais uma vez, denuncio os graves crimes ambientais ocorridos com o violento rebaixamento do nível das águas da represa de Furnas:  “Confesso, Professor Goldenberg, que não me sinto muito à vontade, sendo um simples jornalista de uma pequena cidade do interior de Minas, ao ter que me dirigir a tão seleta plateia, composta certamente, pelas maiores e mais ilustres autoridades mundiais sobre o assunto em pauta. Mas, não poderia me esquivar desta oportunidade, para fazer chegar aos senhores o que de fato ocorreu e vem ocorrendo com a população dos 34 municípios lindeiros ao Lago de Furnas. Dos meus 55 anos de vida, passei grande parte deles ali, à beira d’água, e conheci bem as histórias dos suicídios, das agonias, das desgraças, das incertezas e das insatisfações quando do alagamento das melhores e mais ricas terras do meu e dos outros municípios. E isto, vejo agora, esta Comissão Mundial muito bem detectou e expôs em seu relatório ao analisar como de fato fez, barragens mundo afora.  Mas, acontece que hoje, quase 50 anos depois, da inauguração de Furnas, estamos novamente sendo massacrados pela falta de política do Governo Federal, especialmente após a criação da ONS.-, da Agência Nacional de Energia e que culminou com a briga política entre o Governador Itamar Franco e o Presidente FHC. Não gostaria de me ater a este problema político, mas me sinto no dever de informar aos senhores que da criação de Furnas até agora, já foram gastos,  milhões de dólares em planos feitos pelos americanos (TWV),e  pelo mais recente feito pelos Espanhóis (GERC_INATUR) e também através de outras medidas e planos onde se detectou ao longo do lago, os locais mais apropriados para a exploração turística, da  agricultura, do trato da pecuária e outras atividades. Furnas, se comprometeu a fazer muita coisa em prol das populações e regiões atingidas pela inundação. Tudo está lá, registrado nos papéis, nos documentos de sua fundação, ainda à época de JK. E nada foi cumprido. Ela apenas tem pago nos últimos anos, aos municípios, irrisórias quantias a título de royalties, que não os recompensa infimamente em relação as perdas havidas. Praticamente nada! De três anos para cá, aquele sonho de que parte das populações atingidas seriam recompensadas com a implantação maciça de projetos turísticos que afloraram na região norte do lago, nas águas doces às quais se referiu o Professor Goldenberg ainda há pouco em seu discurso de abertura desta solenidade, o que sei é que nos vimos, repentinamente,  nesta condição de penúria em que os povos das terras inundadas por Furnas hoje, se encontram. Com as águas  batendo nos limites mínimos de 12% do volume útil do reservatório, tudo está diferente e os prejuízos são incalculáveis.  Isto significa que barcos, clubes, hotéis, restaurantes e todos os demais projetos,  investimentos  e equipamentos instalados  na região, todos por haverem acreditado no governo e apostando que o lago continuaria existindo, foram,  todos por água abaixo e o que é pior, exatamente pela  falta dela. E para espanto nosso, através de dados obtidos dentro da própria Furnas Centrais Elétricas, – me perdoem a franqueza, os senhores da ANEEL e de outros órgãos governamentais que me antecederam em suas falas  – demonstramos que a vazão afluente nos últimos três anos, foi muito maior que nos últimos mais de 40, quando a represa se apresentava durante  grande parte do ano, próxima de sua quota máxima, a 768. Então senhores, tudo isto para nós,  é um problema claramente político ou de falta de gestão adequada.  Hoje,  os dados retirados de Furnas e que estão aqui à disposição dos senhores, mostram que a vazão afluente é inferior à vazão turbinada.  A produção em megawatts, por outro lado é inferior à de anos anteriores  quando  se turbinou menor volume de água. Isto nos leva a crer que realmente,  tem turbina rodando na banguela , repassando água aqui para baixo. Falo em tom de denúncia, e trago um pedido para que esta comissão cuide e bem do assunto,  já que entendemos que a solução para os graves problemas econômicos e sociais destas regiões, como o desemprego instaurado na área do turismo e outras,  a perda dos investimentos feitos até mesmo  em cursos onde  SENAC, SESC e outros foram parceiros,  para a formação  de simples “porteiros de pensões ou hoteizinhos a mâitres , à criação de uma Faculdade de Turismo como a de Formiga, que já entregou ao  mercado cerca de 50 turismólogos”, tudo isto como dito, foi por água abaixo, e exatamente, repito, pela  falta do que antes aqui abundava. E tudo isto ocorreu, não por culpa de São Pedro, mas certamente por culpa exclusiva de quem coordena esta política de geração de energia ou atendeu a caprichos outros. Depois de tudo interligado, sabemos todos, tanto faz gerar ali no sul, aqui, ou no norte. Prova disto é que na Rede Globo, na última sexta feira, foram exibidas fotos da represa, ou melhor, do deserto em que grande parte dela se transformou, com o solo rachado, e apesar disto se afirmou na mesma matéria que: apesar da falta de chuvas, não faltará energia pois, ela será gerada no sul.

É senhores. Não quero ser cansativo. Repetitivo!

Mas, infelizmente, não tem outra forma. A historia de hoje é a mesma de ontem. Triste repeteco.

Após 21 anos nada mudou. A não ser a incompetência e teimosia de alguns que, convenhamos, repetem a mesma lenga-lenga há décadas.

Os power points frequentam as mesmas salas refrigeradas e as medidas transformadas em ordens, resoluções, notas ou sabe-se lá o que mais, delas saem aos borbotões enquanto nossas águas são surrupiadas das mais diversas formas.

E a culpa? É claro, é de São Pedro!

A grande imprensa é parceira certa para divulgar o que lhe convém!

Por aqui, capivaras morrem aos montes sem uma poça d’água para se refrescarem ou fugirem do fogo que é ateado no imenso pasto em que se transformou o que um dia foi lago.

Hotéis quebrados, investimentos outros nas mais diversas áreas – piscicultura – turismo – náutica – agroindústrias – indústria de equipamentos náuticos – rede de restaurantes – campings – etc. Todo mundo parado, quebrado e desempregado.

Até quando?

Pergunto aos amigos prefeitos. Será que os tais royalties compensam toda esta miséria?

E o meio ambiente: Como fica? O saneamento, as balsas, as doenças que a proliferação de insetos nas poças d’água lhes serve de guardiã, compensam? 

Gente, em 2000, eu tinha 55 anos. Esperei 21, mas hoje tenho uma só certeza. Não aguento esperar mais tantos anos. É hora de Minas Gerais dar um grito de independência e exigir o cumprimento da sua e da Constituição Federal. Cumprimento da Emenda 106, já. Multiuso da águas e defesa de nosso meio ambiente, é o mínimo que os senhores, componentes desta respeitável Mesa, nos devem garantir. Garantir, prometer só, não!

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