A desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), foi presa nesta sexta-feira (29), durante a Operação Joia da Coroa, um desdobramento da Operação Faroeste, deflagrada em 19 de novembro e que apura um esquema de vendas de sentenças relacionadas à grilagem de terras no oeste da Bahia.

Segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), Maria do Socorro estaria destruindo provas e descumprindo a ordem de não manter contato com funcionários. Indícios sobre isso foram reunidos pela PF e pelo Ministério Público Federal (MPF).

O advogado João Daniel, que defende a desembargadora, diz que “não houve destruição de provas”. Ele afirma que, caso ela tivesse sido chamada para depor, teria esclarecido os pontos abordados na decisão.

“A prisão é extremamente desnecessária, até porque já tinha sido afastada das funções”, disse o defensor.

Em nota, o TJ-BA informou que adota todas as medidas cabíveis para colaborar com a investigação, “sempre respeitando o ‘Princípio do Contraditório’, que preserva a proteção ao direito de defesa”.

Investigações e prisão

A PGR diz, em nota, que as apurações já realizadas reuniram indícios de relações indevidas entre a magistrada e outros investigados no esquema. Um deles é Adaílton Maturino, preso na primeira etapa da operação. Conforme consta da decisão, o investigado, que se apresentava como cônsul de Guiné Bissal, tem uma extensa ficha de crimes e só teve a atividade delitiva suspensa com a prisão.

Após deferir a prisão, o ministro Og afirmou que prisão era necessária porque ela vinha usando a estrutura do judiciário para destruir elementos. “Estou convencido de que medidas menos gravosas resultarão prejudiciais para a investigação dos fatos, tendo em vista a conduta da investigada de criar óbices à respectiva apuração. Registre-se como exemplo o uso do prestigiado cargo de desembargadora e do seu gabinete para acionar a estrutura do Judiciário a fim de destruir elementos probatórios”, disse.

Segundo um relatório emitido pelo MPF, durante a busca e apreensão, foi encontrado na casa da desembargadora um grande estojo, do tipo mostruário, com anéis, relógios (com estampa de uma grande marca de luxo), brincos, além de um colar de ouro com aparente valor de mercado. No imóvel, também foram localizados vários quadros, incluindo alguns embalados. Os objetos não foram apreendidos.

O documento informou que foram apreendidos sete canhotos de talões de cheques com referência a pagamentos de artistas baianos, comprovantes de pagamentos de joias e acessórios e também de despesas de imóveis, referentes as localidades do Canela, Flamengo, Graça, Barbalho, Santo Antônio Além do Carmo, Praia do Forte, Penha e São Gonçalo dos Campos, todos no nome de Maria.

Foram encontradas também, durante a busca e apreensão, diversas anotações sobre processos judiciais, com indicação de postura a ser adotada. Além de ficar contatado que ela movimentou R$ 1.790.88,82 sem declarar origem e destino.

De acordo com o documento do MPF, a análise das diligências, das apreensões e da exploração de dados comprova que o padrão de vida levado pela desembargadora, com jóias, altos valores em dinheiro, obras de arte e bolsas, é acima do esperado para uma servidora pública.

Outras prisões

Além das novas buscas e da prisão da desembargadora, nesta etapa da operação, quatro investigados tiveram as prisões temporárias convertidas em preventivas, por tempo indeterminado: Adailton Maturino dos Santos, Antônio Roque do Nascimento Neves, Sérgio Humberto Sampaio, Geciane Souza Maturino dos Santos e Márcio Duarte Miranda.

Maria do Socorro é a segunda magistrada a ser presa neste caso. No sábado (23), a Polícia Federal prendeu o juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio, da 5ª Vara de Substituições da Comarca de Salvador.

Juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio foi preso em 23 de novembro em um desdobramento da Operação Faroeste, uma ação contra venda de sentenças para grilagem de terras na Bahia — Foto: Reprodução/TVGlobo

O juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio, que foi preso no último sábado, estava afastado do trabalho desde 19 de novembro, quando começou a operação.

Ele e outros quatro desembargadores, entre eles o presidente do TJ-BA, Gesivaldo Britto, são investigados no suposto esquema de venda de decisões judiciais, além de corrupção ativa e passiva, lavagem de ativos, evasão de divisas, organização criminosa e tráfico de influência no estado. Após a operação e o afastamento de magistrados, as novas eleições para a Mesa Diretora do TJ-BA, que seria 20 de novembro, foram adiadas.

Segundo a decisão do STJ, a prisão de José Valter Dias e do juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio só foram decretadas após a operação porque os dois suspeitos não foram encontrados durante as buscas realizadas no dia 19 de novembro. O ministro Og Fernandes destacou que a medida foi necessária para preservar a investigação e evitar fugas.

Ainda de acordo com a decisão do STJ, o juiz Sérgio Humberto mantinha uma vida de luxo em uma residência avaliada em R$ 4,5 milhões e aluguel mensal de R$ 10 mil, fora a taxa condominial. Foram encontrados na casa do juiz quatro carros de luxo, entre eles um Porsche e uma BMW, além de três relógios Rolex e joias. Segundo o ministro Og Fernandes, esse patrimônio ultrapassa o patamar normal financeiro de um servidor público.

Operação Faroeste

A primeira fase da Operação Faroeste ocorreu em 19 de novembro, com a prisão de quatro advogados, o cumprimento de 40 mandados de busca e apreensão e o afastamento dos seis magistrados”

Os mandados foram expedidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e houve bloqueio de bens de alguns dos envolvidos na investigação sobre legalização de terras no oeste baiano, no total de R$ 581 milhões. Segundo o STJ, o grupo integra uma organização criminosa. O afastamento dos magistrados vale por 90 dias.

No dia 20 de novembro, a Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) instaurou procedimento contra os magistrados do TJ-BA.

Na quinta-feira (27), José Valter Dias, um dos alvos da operação, chegou a se apresentar à Polícia Federal em Teresina (PI), mas foi liberado após ser ouvido. De acordo com a PF, o depoimento ocorreu na noite de terça-feira (26), em um delegacia do órgão. José foi solto por determinação do ministro relator.

Estão afastados:

Gesivaldo Britto, desembargador presidente do TJ-BA;
José Olegário Monção, desembargador do TJ-BA;
Maria da Graça Osório, desembargadora e 2ª vice-presidente do TJ-BA;
Marivalda Moutinho, juíza de primeira instância
Maria do Socorro Barreto Santiago, desembargadora do TJ-BA
Sérgio Humberto Sampaio, juiz de primeira instância

Foram presos:

Sérgio Humberto Sampaio, juiz de primeira instância
Adailton Maturino dos Santos, advogado que se apresenta como cônsul da Guiné-Bissau no Brasil
Antônio Roque do Nascimento Neves, advogado
Geciane Souza Maturino dos Santos, advogada e esposa de Adailton Maturino dos Santos
Márcio Duarte Miranda, advogado e genro da desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago
Maria do Socorro Barreto Santiago, desembargadora
O TJ informou ainda que, “quanto aos processos dos desembargadores afastados, o regimento interno prevê a substituição automática dos desembargadores” e que, por conta disso, “não haverá prejuízo às partes”.

Dois juízes substitutos foram convocados para assumir temporariamente os cargos dos desembargadores José Olegário Monção e Maria do Socorro Barreto Santiago.

Falso cônsul
Um dos principais suspeitos no esquema, o empresário Adailton Maturino, cuja esposa detém cerca de metade das ações da JJF Holding, é apontado como o idealizador do esquema no TJ da Bahia.

Maturino se apresenta falsamente como cônsul da Guiné-Bissau e juiz aposentado, segundo o processo. Ele tem 13 CPFs em seu nome e relações com o borracheiro que se tornou “de forma repentina” dono de uma terra imensa na Bahia.

A embaixada, segundo o ministro Og Fernandes, chegou a emitir ofício qualificando Adailton como diplomata e cônsul honorário. Mas, o Ministério das Relações Exteriores informou que o governo brasileiro “não autorizou, em qualquer momento”, a designação dele como agente diplomático.

“É falsa a informação contida nos ofícios (…) enviados pela embaixada de Guiné-Bissau no Brasil”.

De 2013 a 2019, Adailton Maturino teria movimentado R$ 33 milhões sendo que não se comprova a origem de R$ 14 milhões. Diálogos mostram, segundo a decisão, “uma enormidade de gastos” de Adailton com festas e luxos, incluindo contratação de shows de cantores famosos.

“O MPF argumenta que Adailton sentou-se na primeira fileira na posse de Gesivaldo Britto na presidência do TJBA”, diz o processo.

 

Fonte: Matéria do G1||https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2019/11/29/ex-presidente-do-tribunal-de-justica-da-bahia-e-presa-em-acao-contra-venda-de-sentencas.ghtml
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