A inflação mostra a sua cara para o cidadão comum nas pequenas coisas. Um levantamento feito pelo ‘Estado’ com base em uma amostra aleatória de 15 produtos e serviços que, juntos, respondem só por 3,5% da inflação oficial do país mostra que em 12 meses até julho todos esses itens registraram variações de preços bem superiores à alta do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 6,27%.
Na liderança e na vice-liderança do ranking da inflação das pequenas coisas estão os serviços de depilação e de manicure que ficaram mais caros 14,78% e 12,07%, respectivamente. Isto é, subiram o dobro da inflação do período. O peso do serviço de depilação é de 0,01% no IPCA e o de manicure, de 0,43%.
Na sequência vem o estacionamento, cujo preço subiu 11,98% em 12 meses até julho, e o cafezinho, que aumentou 11,6%. O estacionamento responde por 0,11% do IPCA e o cafezinho por 0,07%.
Essa inflação das pequenas coisas é que passa para o consumidor a ideia de descontrole, afirma o economista Heron do Carmo, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP e um dos maiores especialistas em inflação.
Segundo ele, as pessoas comuns não têm condição de traduzir para o seu dia a dia o que é uma alta de 0,03% na inflação. Heron faz referência ao resultado do IPCA de julho, o menor em três anos e que foi comemorado pelo governo por trazer a inflação acumulada em 12 meses de volta ao intervalo previsto pela meta do governo.
Mas, de acordo com o economista, quando o consumidor começa a notar que os preços de alguns produtos e serviços que ele compra com regularidade, independente do peso que eles tenham no orçamento, estão subindo com maior frequência, isso dá a percepção de uma inflação sem controle.
<2>Estacionamento

É exatamente essa sensação de descontrole de preços que o cineasta Pedro Amorim, de 35 anos, pai de dois filhos, tem. Na última sexta-feira, ele ficou indignado com o que gastou para estacionar o carro no restaurante Pira Grill, da Vila Madalena, em São Paulo. Ele pagou R$ 18 para estacionar o veículo e R$ 35 pelo prato à la carte. Se tivesse optado pela refeição comercial, de R$ 23, a diferença entre o gasto com a refeição, que envolve os ingredientes e o preparo do prato, e o estacionamento, que é basicamente serviço, poderia ter sido ainda menor. É um absurdo. Há um descontrole entre os preços.
Ele disse que nota como anda a inflação não pelos índices dos institutos de pesquisas, mas de olho nos gastos que tem com pequenas coisas no dia a dia e a frequência com que esses preços são reajustados. No caso da escola dos filhos, Amorim lembrou que existe uma regra e o reajuste da mensalidade ocorre uma vez por ano.
Cristian Dimitrius, de 38 anos, cinegrafista, é outro consumidor que acompanha o custo de vida atento para frequência com que os preços das pequenas coisas aumentam. E não existe uma regra clara para aumentar os preços dessas pequenas despesas, ressaltou, também indignado com a desproporção entre o preço da refeição pago no restaurante e do estacionamento.

<3>Impostos

Essa desproporção entre os preços de pequenos gastos provocados pelo avanço da inflação, com o preço do prato e do estacionamento, já foi observado pela proprietária do Pira Grill, Vera Marta Canesin. Isso espanta o cliente, que acaba vindo a pé, conta ela.
A empresária explica que o serviço de estacionamento do restaurante é prestado por uma empresa especializada. Ela diz que também não concorda com a desproporção entre os preços da refeição e do estacionamento, mas ressalta que, diante dos custos elevados, especialmente dos impostos e do preço do terreno na região, torna-se improvável ter um preço menor.

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