A vendedora de uma loja de bijuterias de Muriaé, na Zona da Mata Mineira, passou quase um ano e meio temendo a data mais aguardada por todo trabalhador: a do pagamento. Para receber parte da remuneração, a profissional era submetida a uma situação vexatória: subir na balança e mostrar ao chefe que havia perdido peso.

O caso foi parar na Justiça. A 1ª Vara do Trabalho de Muriaé condenou o estabelecimento a pagar indenização no valor de R$ 50 mil por danos morais à ex-funcionária. A decisão foi proferida em 13 de novembro. 

De acordo com o Estado de Minas, a loja informou que interpôs recurso à decisão judicial e aguarda o fim do processo para se manifestar. 

Ainda muito abalada com a situação, a vendedora de 26 anos preferiu se pronunciar por meio da advogada, Grazielle Berizonzi. A defensora conta que, para receber uma complementação salarial no valor de R$ 200, sua cliente era obrigada a cumprir metas de emagrecimento estipuladas pelo patrão, que chegavam a cinco quilos por mês. 

“Para atingir as tais metas, ela ficava sem comer e até vomitava algumas refeições. A proximidade da data de pagamento passou a gerar pânico, virou uma tortura. Durante o período em que trabalhou na loja, chegou a emagrecer, mas não foi um emagrecimento saudável. O custo à saúde mental foi muito grande”, relata a Berizonzi. 

Conforme a sentença judicial, os métodos exigidos para comprovação da perda de peso da trabalhadora eram tão rigorosos, quanto humilhantes. Fotos anexadas ao processo mostram bilhetes deixados pelo chefe em que ele determina: “Favor apresentar pesagem do dia 5/6/2019 com carimbo da academia, certificando que o peso foi realizado no dia”. 

Em outro recado, escrito no envelope usado para acondicionar o complemento, o gestor avisa: “Caso não tenha perdido o peso (combinado) do mês de julho, favor devolver os R$ 200″. 

‘Desculpa de peidorreiro’

Um áudio gravado pela funcionária, também arrolado ao processo, registra um dos momentos em que foi constrangida a se pesar em uma balança comprada pelo patrão. Antes de subir no aparelho, a vendedora se justifica: “Eu me pesei sexta-feira. Deixa eu te mostrar a foto (da pesagem), deu 95,4 kg. (Antes), estava com 96,2 Kg. Mas, essa semana, deve dar mais, pois estou menstruada e retenho muito líquido, fico inchada”. 

A vendedora então sobe na balança. Insatisfeito com os números apresentados, o chefe retruca: “Isso (a menstruação) é desculpa de peidorreiro!”. Em seguida, investiga o cotidiano de D. e se sente à vontade para questionar a frequência dela à academia. “Você está fazendo tudo direitinho? Por que naquele dia, 19h, você estava me mandando mensagem e não fez academia?”. Por fim, ameaça: ‘Vou te dar uma colher de chá dessa vez, hein? Mês que vem, se não tiver perdido….”.

“A situação chegou nesse ponto de degradação: uma funcionária foi obrigada a compartilhar com seu chefe informações íntimas, referentes ao seu ciclo menstrual, para justificar por que não atingiu o peso que ele esperava – e, assim, conseguir receber o dinheiro que lhe era devido”, observa a advogada Grazielle Berizonzi. 

De acordo com a ação judicial, a vendedora recebia pouco mais de um salário mínimo. Os R$ 200 eram pagos a título de complementação salarial. A funcionária trabalhou na empresa entre janeiro de 2019 e junho deste ano. 

Em sua decisão, o juiz Marcelo Paes Menezes reconhece que a trabalhadora foi vítima de assédio moral e acrescenta: “Tenho que a autora foi submetida à violência psicológica extrema, de forma habitual por um período prolongado com a finalidade de desestabilizá-la emocional e profissionalmente. A ação da ré (a loja) colocava em xeque o amor próprio da obreira, ao repugnar seu próprio corpo para atender ao padrão estético do sócio da empresa”.

Fonte: Estado de Minas

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