Kobe Bryant, de 41 anos, morreu na tarde desse domingo (26) em um acidente de helicóptero, na cidade de Calabasas, na Califórnia. As informações iniciais indicavam que o ex-jogador da NBA estava ao lado de outras quatro pessoas, mas que nenhuma seria da família do astro. Depois, porém, foi confirmada a notícia de que Gianna, sua filha de 13 anos, também estava na aeronave. Além deles, outras sete pessoas estavam no acidente, incluindo uma amiga de Gianna e um familiar dela, um técnico e o piloto.

O helicóptero deixou Orange County, onde Kobe e sua família moravam, e seguiria para Thousand Oaks, onde Gianna jogaria uma partida de basquete. O acidente ocorreu às 9h47 do horário local (14h47 no horário de Brasília). As causas da queda do helicóptero, de modelo Sikorsky S-76, ainda não foram reveladas. De acordo com oficiais envolvidos no atendimento no local, o fogo demorou cerca de uma hora para ser controlado, apesar da ajuda de outro helicóptero. Um total de 56 bombeiros participaram do atendimento. Alex Villanueva, xerife do condado de Los Angeles, afirmou que as investigações estão em curso para apurar as causas do acidente.

Os nomes de todas as vítimas, segundo as autoridades, serão divulgados oficialmente nesta segunda-feira. Horas após o acidente, o Orange Coast College confirmou que o técnico John Altobelli, sua mulher, Keri, e sua filha, Alyssa, estavam entre as vítimas. Funcionário do colégio por 27 anos, ele servia como mentor de jovens atletas da instituição. Christina Mauser, assistente técnica do time feminino da Harbor Day School, também faleceu, segundo seu marido. De acordo com a rede de TV americana CBS, as outras três vítimas seriam Sarah Chester e sua filha Payton, provavelmente também do time de basquete feminino da academia de Kobe, e o piloto Ara Zobayan.

  • Estamos investigando e vamos transferir a investigação para a agência federal responsável por aeronaves. Não tivemos sobreviventes. Nove pessoas estavam a bordo, o piloto e mais oito. Não podemos identificar ninguém neste momento. Não seria adequado e é desrespeitoso. Ninguém pode saber de uma morte através de um site. Vamos esperar o trabalho dos legistas. É um trabalho difícil. Não podemos falar mais nada – afirmou.

As primeiras informações diziam que Kobe não estava acompanhado de nenhum familiar. O repórter Adrian Wojnarowski, da “ESPN”, confirmou, porém, que Gianna, de 13 anos, seguia com o pai para um jogo em Thousand Oaks.

O acidente foi noticiado pouco antes do início da rodada deste domingo na NBA. A liga americana ainda não havia se pronunciado oficialmente, mas houve um minuto de silêncio antes da partida entre Denver Nuggets e Houston Rockets. Pouco depois, em seu site oficial, a NBA declarou luto pela morte. No duelo entre Toronto Raptors e San Antonio Spurs, a equipe canadense deixou o cronômetro estourar nos primeiros 24 segundos em homenagem ao ex-jogador. Na sequência, os Spurs repetiram o gesto. O mesmo foi feito em outros jogos da noite.

De tão imodesta, uma verdade soa a ultraje: Kobe esteve fadado a ser um dos melhores de sua geração desde os primeiros arremessos. Filho de Joe Bryant, jogador de nível mediano na NBA dos anos 70 e 80, Kobe viveu seus anos de formação na Itália, onde o pai decidiu apostar as fichas ao fim da carreira. Foram anos que moldaram seu jogo de maneira única em relação a outros jovens americanos. Enquanto nos Estados Unidos a AAU – Amateur Athletic Union, organização não lucrativa dedicada a promover novos jogadores nos EUA – empurrou os atletas para o desenvolvimento de aspectos físicos como atleticismo, força e explosão, na Itália, Kobe Bryant pôde beber da fonte do “fundamento acima de tudo”, um mantra repetido exaustivamente no basquete de base de países como Argentina, Espanha, Lituânia e claro, Itália.

Em 20 anos de NBA, todos vestido com a camisa do Los Angeles Lakers, Foram cinco títulos (2000, 2001, 2002, 2009, 2010), um prêmio de MVP (2008), dois troféus de MVP das finais (2009 e 2010), 11 nomeações para a seleção da NBA, nove nomeações para a seleção de defesa, 18 All-Star Games, duas vezes cestinha da temporada, terceiro maior cestinha da história da liga, segunda maior pontuação em um jogo (81 contra o Toronto). Sem falar naquilo que não se mede: a liderança, o caráter, o estilo, a beleza dos movimentos, o papel inegável na popularização do basquete mundo afora. Kobe se aposentou em 2016 como terceiro maior pontuador da história, posto que perdeu na noite de sábado, para LeBron James. Em seu último jogo, marcou 60 pontos e se despediu à altura de sua grandeza.

Na derrota do seu Los Angeles Lakers para o Philadelphia 76ers por 108 a 91, na Filadélfia, o camisa 23 ultrapassou Kobe Bryant (33.643 pontos), fechou o jogo com 29 pontos e agora soma 33.655 pontos, ficando atrás apenas do líder Kareen Abdul-Jabbar (38.387) e Karl Malone (36.928).

A grandeza de Kobe também o levou a conquistas no cinema. “Dear Basketball” venceu a disputa pela estatueta na categoria “Melhor Curta de Animação” no Oscar de 2017. O curta transforma em animação a carta de despedida que Bryant escreveu ao The Player’s Tribune, em novembro de 2015, anunciando que se aposentaria do basquete ao final daquela temporada.

Kobe Bryant foi roteirista, narrador e produtor executivo da obra, dirigida pelo animador Glen Keane. A trilha sonora é de John Williams. Com cinco anéis de campeão da NBA, um título de MVP, duas medalhas de ouro olímpicas e 18 participações aparições no All-Star Game no currículo, o ‘Black Mamba’ é o primeiro atleta da história a conquistar a cobiçada estatueta. No palco, Kobe Bryant agradeceu à sua família.

Símbolo de uma era

A morte de Kobe causou um impacto devastador. O contexto das últimas décadas ajuda a explicar tamanha comoção. Kobe não foi o maior ou o melhor jogador de todos os tempos. Mas foi o primeiro grande ídolo de massa da época em que a magia da NBA se espalhava pelo mundo em velocidade assustadora.

Michael Jordan ocupa, com justiça, o topo do Olímpio. Mas sua carreira, de 1994 a 2003, viveu o auge em um período pré-internet, antes das redes sociais. Jordan foi gigante globalmente, mas antes dos memes, dos vídeos curtos, da arte de se tornar viral. Kobe, além de ter abraçado com classe inigualável a missão de ocupar o vácuo deixado por Jordan como dono da NBA, brilhou em escala global. Seus jogos já eram transmitidos para todo o planeta, seus lances já ecoavam pelo Twitter, pelo Facebook, pelo Instagram, pelo Whatsapp.

No Brasil, por exemplo, é incontável o número de garotos e garotas que começaram acompanhar o esporte por causa de Bryant. O fato de defender uma das franquias mais tradicionais da história também ajudou, claro. O Los Angeles Lakers é uma fábrica de lendas desde os anos 60: Jerry West, Wilt Chamberlain, Kareem Abdul-Jabbar, Magic Johnson, Shaquille O’Neal… até LeBron James passou a vestir roxo e dourado. Formados ou não em Los Angeles, alguns dos maiores nomes da história da bola laranja brilharam no time mais hollywoodiano do mundo. Não por acaso, a entrada do ginásio Staples Centers é lotada de estátuas, que atraem turistas e fãs do basquete, seja em dia de jogo ou até fora da temporada.


Kobe foi um mestre no meio desse caldeirão de mestres. Catequizou jovens torcedores, inclusive no Brasil, onde acumulou um séquito de fãs enquanto esteve em quadra. Pontuou essa trajetória com dois elementos fundamentais para a construção de uma lenda: um talento colossal e o espírito competitivo extremo que lhe rendeu o apelido de Black Mamba, em alusão à cobra dos botes certeiros. Foi assim desde a estreia contra o Minnesota Timberwolves, quando não fez nenhum ponto, até a despedida contra o Utah Jazz, quando fez incríveis 60.

Fora da quadra, Kobe visitou extremos. Em 2003, foi acusado de abusar sexualmente de uma camareira de hotel de 19 anos, num caso em que o jogador passou praticamente incólume na esfera jurídica, com um pedido de desculpas público e um anel milionário de presente para a esposa como pedido de desculpas pela traição. Ignorar este fato seria injusto com a vítima e deixaria incompleta a própria história de Kobe.

Ao mesmo tempo, a reputação extra-quadra ganhou contornos bem mais simpáticos com a imagem do cara que ajudava todo mundo, inclusive sendo mentor de outros jogadores, como Jayson Tatum, do rival Boston Celtics. No caso específico do Brasil, a relação com Oscar Schmidt criou uma proximidade única. Kobe era fã de Oscar, e vice-versa.


Mas o que realmente vai fixar o legado nos livros de História é o que ele fez com a bola de basquete na mão. Os dois ouros olímpicos, os cinco títulos da NBA, as 18 participações em All-Star Game, o prêmio de MVP, os 33.643 pontos – ultrapassados por LeBron James um dia antes da queda do helicóptero, em uma coincidência dessas de arrepiar.

A última manifestação de Kobe nas redes sociais foi justamente uma postagem em respeito a LeBron: “Continuando a levar o jogo adiante, @KingJames. Muito respeito, meu irmão”. Se isso não é uma passagem de bastão emblemática e emocionante, o que mais será?

Em fevereiro, Kobe estará na lista dos indicados à turma 2020 do Hall da Fama. Já estaria, de qualquer jeito, em mais uma coincidência comovente. Mas a festa será linda. Os jogos da NBA daqui até o fim da temporada serão diferentes – incluindo o próximo jogo do Los Angeles Lakers, na noite de terça-feira, em casa, contra os rivais Clippers.
E se dá para extrair disso tudo algo positivo, o legado está todo aí. A carreira foi amplamente documentada. Dos memes aos documentários, a obra fica. A memória permanece. O homem que ajudou a inaugurar a era dos grandes ídolos globais do basquete se despede.

Descansa, Mamba.

 

Fonte: G1||
COMPATILHAR: