Florianópolis tem o Projeto Floripa Letrada, que consiste em estantes nos terminais de ônibus, onde são disponibilizados livros, revistas e apostilas. A proposta é que os usuários dos ônibus urbanos levem os livros para ler e depois devolvam, para que outras pessoas possam fazer o mesmo, mas aqueles que devolvem são muito, muito poucos. Nos últimos tempos não tenho passado nos terminais de ônibus, por causa da pandemia, mas acho que não há livros lá, para não facilitar o contágio.

O projeto existe e deve voltar com o fim da panemia. Ele persiste graças a doações de empresas e pessoas físicas e, como disse acima, nos últimos anos o forte do que era oferecido nas estantes eram as apostilas didáticas ou técnicas, novas ou usadas. Algumas defasadas, mas outras em perfeito estado para serem usadas, até novas, que nunca foram abertas. Eu até peguei uma apostila de inglês e outras de matemática e as usei.

Mas num curto período, algum tempo antes da pandemia chegar, a gente encontrava livros literários mais frequentemente e em maior quantidade nas estantes do Floripa Letrada. Livros antigos, mas obras importantes de autores consagrados, como Mário de Andrade, Monteiro Lobato, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes, Pedro Bandeira, Salim Miguel, Sérgio da Costa Ramos, Pedro Block, Dostoievski e tantos outros.

Pelo carimbo que havia em todos os livros, ficou-se sabendo que os livros eram da biblioteca de um grande colégio da capital, tradicional e ainda elitista. É interessante que no tal carimbo consta o nome do colégio e a esclarecedora observação: “Baixa de acervo”.

Acho ótimo que disponibilizem obras de qualidade para a leitura dos usuários do transporte público, pois temos a oportunidade de ler bons livros sem ter que pagar nada, mas fico pensando aqui com meus botões: a boa literatura fica velha?  Nunca vi uma escola se desfazer do acervo de sua biblioteca assim, descartando todos os livros publicados há mais de uma década, como se não servissem mais para os seus alunos, como se estivessem completamente defasados para aquela escola.

Já vi, infelizmente, uma escola de uma cidade vizinha jogar fora – jogar no lixo, mesmo -, livros didáticos novos. O diretor foi despedido. Mas descartar livros de uma biblioteca por serem velhos, é novidade. O livro pode até ficar velho, mas a obra, não. Será que a escola só queria abrir espaço, nas suas dependências, para outra atividade? Eu poderia dizer que fizeram bem porque os livros seriam lidos novamente por vários leitores, cada um daqueles volumes descartados, mas como mencionei acima, o propósito de ler e devolver ao projeto Floripa Letrada não é cumprido. Então os estudantes que se renovam a cada ano, na escola que cedeu os livros, poderiam ler e recriar a escritura de tantos autores muito mais vezes. De qualquer maneira, eles terão, espero, livros mais contemporâneos para ler, ou mesmo os clássicos em novas edições. E nós, cá de fora, teremos as obras que foram publicadas há mais tempo, graciosamente. Menos mau.

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