Ministério da Saúde anunciou nesta quinta que vai criar um grupo de trabalho para estudar a questão da fosfoetanolamina e apoiar a realização dos estudos necessários para avaliar a eficácia da substância contra o câncer.

Distribuída pela USP de São Carlos por causa de decisões judiciais, a fosfoetanolamina é alardeada como cura para diversos tipos de câncer, mas não passou por esses testes em humanos, por isso não é considerada um remédio. Ela não tem registro na Anvisa, e seus efeitos nos pacientes são desconhecidos.

Uma portaria que deve ser publicada pelo Ministério da Saúde no Diário Oficial da União desta sexta-feira estabelece um prazo de 60 dias para o grupo apresentar um plano de trabalho para desenvolvimento do projeto. O objetivo é que a substância passe por testes pré-clínicos e clínicos com a colaboração da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e da Fiocruz.

“Estamos colocando à disposição do professor responsável pela síntese dessa molécula a possibilidade de submeter à fosfoetanolamina a todos os protocolos para verificar se a substância é ou não eficaz e por fim a essa celeuma”, afirmou o ministro da Saúde, Marcelo Castro, em nota divulgada pela pasta.

Até o momento, o grupo de pesquisadores que desenvolveu a síntese da fosfoetanolamina alegava que os testes clínicos não tinham sido concluídos pois havia má vontade por parte da Anvisa.

Início do embate. A fosfoetanolamina tornou-se objeto de embate depois que decisões da Justiça obrigaram a USP a produzi-la e fornecê-la a mais de mil pessoas, apesar de não ter comprovação de eficácia devido à falta de testes.

Em nota, a USP já informou que a fosfoetanolamina não é remédio, foi estudada como produto químico e não há “demonstração cabal de que tenha ação efetiva contra a doença”.

A universidade disse ainda não ser uma indústria química ou farmacêutica e que não tem condições de produzir a substância em larga escala para atender às “centenas de liminares”.

Após ouvir a nota lida no início da audiência no Senado, Chierice reagiu: “Acho que o reitor deveria primeiro experimentar”.

Ato de desagravo. Planejada para discutir as evidências disponíveis, o encontro acabou por se tornar um ato de apoio à fosfoetanolamina, com maior número de convidados favoráveis à substância e críticas àqueles que faziam ressalvas sobre a falta de comprovação de segurança.

Além de Chierice, estiveram no encontro pesquisadores da USP, Butantan e Unifesp que apresentaram dados de pesquisas pré-clínicas com a substância, para as quais a fosfo age apenas nas células tumorais, sem afetar as demais. Um grupo de pacientes na plateia apoiava e aplaudia Chierice.

Em meio às reações do público, coube ao presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, esclarecer que todos os dados apresentados se referem apenas a testes iniciais e apresentar as etapas de desenvolvimento da pesquisa clínica. “A regulação sanitária é importante para proteger a saúde da população”.

Segundo Barbosa, a agência está disposta a dar aval para novas pesquisas caso solicitado. “Dentro do nosso papel faremos todo o possível para que dúvidas sejam retiradas e o processo de pesquisa clínica seja realizado em condições adequadas”, completou.

“Provem que não funciona”, diz autor

O professor aposentado de química da USP Gilberto Chierice rebateu nesta quinta as críticas sobre a fosfoetanolamina. “É uma situação que chega a ser constrangedora. Já fui chamado de garrafeiro. Isso não funciona em ciência. Ciência é assim: preto é preto, branco é branco, azul é azul, amarelo é amarelo”, disse ele no Senado.

Chierice comentou o período em que ele afirma ter sintetizado a substância em parceria com o hospital Amaral Carvalho, localizado em Jaú, São Paulo. Sem entrar em detalhes ou apresentar documentos, o professor afirmou que pesquisas sobre a substância foram realizadas e cumpriram regras “não da Anvisa, mas do Ministério do Saúde”.

Braço do ente federal, a agência reguladora, porém, é quem oficialmente define e acompanha os passos de desenvolvimento de futuros medicamentos no país.

Segundo o professor, o “padrão” das pesquisas envolvia 11 pessoas em cada fase. “Essas fases foram feitas. Cadê? Vocês têm que pedir para o hospital. O hospital abandonou , e eu sei qual é o motivo”, disse, sem, porém, informar tais razões.

“Não tenho um dado clínico de todas essas pesquisas. Mas tem muita gente que tomou”, completou em seguida. “Ela já foi chamada de garrafada, de pilulinha mágica. Provem o contrário”, disse.

Em discurso, Chierice negou ter feito exercício ilegal da medicina ao distribuir o composto e disse que as doses da substância foram recomendadas pelo hospital onde trabalhava à época, após os primeiros testes com os pacientes. “Esgotado esse convênio, os pacientes passaram a pegar o medicamento na USP em São Carlos. E isso cresce de uma maneira às vezes incontrolável. Mas nunca inserimos na área médica”, disse.

 
 
 

Redação do Jornal Nova Imprensa

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