Ao se valer de uma ?ferramenta genética? inerente ao genoma das mulheres, pesquisadores dos Estados Unidos e do Canadá conseguiram ?silenciar? a cópia extra do cromossomo 21, que causa a síndrome de down.
A pesquisa foi feita dentro de um tubo de ensaio, usando células em cultura, e não há perspectiva de que possa produzir uma ?cura? para a síndrome. Ainda assim, o estudo traz a primeira demonstração prática de que terapias cromossômicas poderão se tornar algo factível no futuro para o tratamento de sintomas associados ao Down e outras síndromes causadas pela duplicação de um cromossomo (chamadas trissomias).
?É uma ideia genial, totalmente inovadora?, afirmou a geneticista Maria Isabel Melaragno, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), após ler o trabalho, publicado ontem pela revista ?Nature?.
O experimento foi realizado com células-tronco de pluripotência induzida (iPS) derivadas de um paciente com síndrome de Down. O que os cientistas fizeram foi inserir no cromossomo extra das células a cópia de um gene conhecido como xist, normalmente responsável por ?silenciar? (ou desligar) uma das cópias do cromossomo x nas mulheres.
O efeito foi o mesmo: o xist desativou os genes do cromossomo 21 extra, fazendo com que as células funcionassem geneticamente como unidades normais. ?O que eles fizeram, essencialmente, foi inserir um ?interruptor? genético que permite ligar ou desligar o cromossomo inteiro?, disse a pesquisadora Lygia Pereira, da Universidade de São Paulo. (USP). ?É um truque engenhoso. Eles pegaram essa ferramenta natural de silenciamento do cromossomo X e usaram para silenciar um outro cromossomo?.
Apesar de as mulheres terem dois cromossomos X, apenas um é 100% funcional. O outro é quase totalmente silenciado pelo xist no início do desenvolvimento embrionário, para evitar uma ?overdose? das proteínas no organismo.
O silenciamento é feito por meio de alterações bioquímicas chamadas ?epigenéticas?, que não modificam a sequência do DNA dos genes, mas instalam ?travas? e causam modificações estruturais que inibem ou alteram o seu funcionamento. As moléculas de RNA codificadas pelo xist recobrem o cromossomo como uma capa ? ou, neste caso, uma mordaça.
Futuro
O geneticista Salmo Raskin, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica, elogia a metodologia usada, mas faz ressalvas. ?A pesquisa ainda está em células-tronco. Vai levar, no mínimo, dez anos para começarmos a tentar aplicar a técnica em humanos, embora esse prazo seja uma mera suposição. Não é bom criar expectativas que a cura virá em breve. Requer ainda muita pesquisa?, disse ao portal iG.
A pesquisa foi liderada pela médica Jeanne Lawrence, da Faculdade Medicina da Universidade de Massachusetts, nos EUA.
Futurista
– Ainda que a nova técnica de ?silenciamento cromossômico? não vire uma terapia, ela poderá dar uma contribuição importante, como ferramenta de pesquisa, para o entendimento dos mecanismos genéticos e biológicos por trás da síndrome de Down e outras alterações cromossômicas.
– A técnica permite criar modelos celulares que reproduzem a biologia da doença in vitro, e que podem ser geneticamente modificados para o estudo de mecanismos e intervenções específicas.

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