Nos tempos mais recentes circulam nas redes sociais debates sobre o Rio Formiga, mostrando a preocupação de alguns cidadãos pelo fato de que ele vai desaparecendo debaixo da vegetação que ocupa seu leito. O Rio Formiga não é mais aquele da infância dos mais idosos, que se lembram dos bons tempos de nele nadar ou pescar e das enchentes que deram muito prejuízo aos vizinhos do rio.

A preocupação faz sentido, e muito. A água é a base da vida; nosso corpo é quase todo água. Não há “quebra galho” para a água, ela é insubstituível. No entanto, independente de preocupações, a água potável está diminuindo, não só no Rio Formiga, como também em todo o planeta. Relatório da ONU em 2015 anuncia que até 2030 o planeta enfrentará um déficit de água de 40%. (Água para um mundo sustentável, ONU, 2015). O Planeta está sedento: o consumo de água cresce exponencialmente; já as fontes de água potável estão secando. É o que acontece com o Rio Formiga. Tanto a população do município quanto as atividades econômicas cresceram. Mais gente, mais produção agropecuária, mais indústrias processando alimentos e materiais, mais energia elétrica; tudo isso consumindo água.

Mesmo assim, maltratamos nossas águas: já cortamos quase todas as árvores nas áreas de recargas hídricas; estamos arando as terras para plantio “morro abaixo”, de forma que os sedimentos corram para as águas mais baixas, assoreando-as; ainda jogamos esgoto in natura direto no leito do rio; despejamos nele os resíduos industriais de todo tipo, como óleos e graxas; manuseamos os agrotóxicos de forma indevida enquanto poluem nossos lençóis de água; lavamos o carro e “varremos” nossas calçadas brincando com a água. Mesmo que dobrássemos a capacidade de fornecimento do Rio Formiga, não conseguiríamos satisfazer tal consumo.

O relatório da ONU enfatiza a “necessidade de mudar a forma como avaliamos, gerenciamos e usamos esse recurso”. Vejamos. Quando um cidadão está desperdiçando água e chamamos sua atenção, ele nos responde simplesmente “estou pagando” como se isso resolvesse o caso. Supõe dizer: quem pode compra mais água e quem não pode compra menos. Supõe a água como mercadoria, livremente oferecida no mercado capitalista. A Legislação Brasileira sobre água (Lei nº 11.445/2007) deixa claro que “Poderão ser adotados subsídios tarifários e não tarifários para os usuários e localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala econômica suficiente para cobrir o custo integral dos serviços”. A água não é só para quem pode pagar; é para todos.

Antes de ser um bem econômico, a água é um bem social. O Saae tem a obrigação de captar água onde houver, tratá-la e distribuí-la para a população; ele não “vende” água. O custo de captação, tratamento e distribuição deve ser rateado entre os consumidores, incluindo um percentual sensato para novos investimentos agora mais necessários ainda.

Toda a água da sub-bacia nasce em nosso município. São perto de 200 nascentes detectadas nos mapas que, secando, secam o Rio Formiga e nos deixam com sede. Rápida visita às nascentes nos permite ver que pelo menos a metade já secou; outras produzem tão pouca água que ela desaparece no solo logo após percorrer alguns metros. Os próprios proprietários rurais estão com dificuldades. O Saae foi obrigado a perfurar poços para comunidades; alguns proprietários rurais só tem a água do Saae, que exige encanamentos quilométricos e custosos.

Se tivermos de buscar água noutra fonte, onde poderia ser? Noutros rios do município fica inviável; a situação está tão ruim quanto no Formiga; estão secando também. No Lago de Furnas é muito distante e, por consequência, de custo muito alto. É mais que urgente que recuperemos a capacidade produtora da sub-bacia do Rio Formiga. É um trabalho que vai exigir de nós muita paciência e persistência. E dinheiro. Muito. Não há alternativa: o problema deve ser enfrentado por todos do município agora. De forma eficaz.

Procure conhecer as Leis 5082, 5157 e o Decreto 7122, editados pelo município. Eles criam e regulamentam o “Programa Vida Nova Rio Formiga” que está no anexo único do Decreto. É um plano para, em dez anos, resgatar a capacidade da sub-bacia para produzir água suficiente para nós. O Saae vai cuidar de implantá-lo. Mas os principais atores são os cidadãos formiguenses, de quem se espera uma mudança de hábitos: consumir água de forma mais respeitosa, considerada por muitos povos como “sagrada”.

Os escritos falam que o Criador destruiu a humanidade uma vez afogada, com um dilúvio. Se não mudarmos o nosso jeito irresponsável com as águas, Ele vai acabar coma humanidade desta vez matando-nos de sede.

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