A Organização Mundial da Saúde (OMS) não inclui o alcoolismo oficialmente na lista de comorbidades que podem aumentar a gravidade da Covid-19, mas alerta, desde o início da pandemia, que o consumo de álcool precisa ser diminuído neste período, já que ele prejudica a imunidade.

 A ciência observa os efeitos do consumo excessivo de álcool sobre o sistema imunológico há muito tempo, mas agora pesquisadores foram capazes de explicar o passo a passo de como a bebida diminui as defesas do corpo. O resultado é um alerta: o uso continuado da substância levou a quadros mais graves de infecções pulmonares e aumentou as chances de morte causada por elas. 

O grupo de cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) avaliou como o álcool interfere na batalha do corpo de camundongos contra uma infecção pulmonar ocasionada por um fungo comum no ambiente, que também ataca humanos. Eles ainda irão pesquisar os efeitos do alcoolismo na resposta contra um tipo de coronavírus, mas já é possível traçar paralelos entre os resultados do primeiro estudo e a Covid-19.

“Nesse caso, o patógeno (organismo infeccioso) que causa a pneumonia não faz diferença. Cada um é diferente, como o coronavírus, mas o mecanismo pelo qual o álcool afeta o sistema imunológico é o mesmo. Quando se pega a doença, o álcool já fez o estrago”, explica o professor da UFMG, Frederico Soriani, orientador do estudo. 

Os cientistas “embebedaram” camundongos durante 12 semanas — o equivalente a cerca de um quarto da vida deles. Um grupo de animais bebia apenas água, enquanto outro consumia uma mistura com cerca de 20% de álcool, concentração similar a um copo metade cheio com cachaça, ou uísque, e completo por água. Como são mais resistentes às alterações sensoriais causadas pelo álcool do que os humanos, os ratinhos não ficavam tropeçando pela gaiola, mas seu consumo da bebida foi análogo ao de uma pessoa com alcoolismo intenso, que bebe todos os dias durante muitos anos. 

Após esse período, os dois grupos foram contaminados com um fungo. Não foi surpresa que os ratinhos que haviam passado os últimos três meses bebendo desenvolveram uma forma muito mais grave de pneumonia e tiveram uma taxa de mortalidade maior. O que chamou atenção foi o modo como o álcool agiu no organismo deles, que pode ser similar ao que acontece no corpo humano. 

Como o álcool altera o sistema imunológico

Quando o corpo é atacado por uma infecção, são liberadas células de defesa do organismo que ajudam a limpá-lo do agente infeccioso, como vírus e fungos. Os neutrófilos são algumas das principais, e é justamente na ação deles que o álcool interfere. 

“Na inflamação, o corpo produz substâncias para se preparar para o combate, mas a produção tem que estar bem regulada. O álcool faz com que uma substância chamada CXCL1, ou KC, seja produzida em excesso. Ela é importante para ativar os neutrófilos e chamá-los até o local da infecção. Mas o aumento exagerado dela no sangue faz com que eles percam a capacidade de saber onde está a infecção. É como se eles ficassem malucos”, elabora o professor Frederico Soriani.

Os poucos neutrófilos que chegam ao pulmão já estão enfraquecidos e sua ação contra a infecção diminui, dando espaço para ela correr solta. O estudo leva em consideração o uso prolongado de álcool, e não a bebedeira ocasional. Ainda assim, a OMS recomenda que todo consumo de álcool seja diminuído durante a pandemia de Covid-19. Na América Latina, cerca de 17% da população aumentou os episódios de “beber pesado” durante os quatro primeiros meses da pandemia, de acordo com um estudo da Organização Pan-Americana da Saúde realizado com aproximadamente 12,3 mil pessoas, mais de um terço delas no Brasil. 

Fonte: O Tempo Online

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