Discursos não faltam, campanhas também não. As estatísticas são cada vez mais alarmantes e as leis mais restritivas. Quando, enfim, essa corrente de força convence um fumante a largar o vício, o futuro ex-fumante ?traga? a contradição das políticas públicas no país: há incentivo para largar o vício, mas o atendimento é limitado para amparar quem decide por isso.
Nesta segunda-feira (31), Dia Mundial Sem Tabaco, o Brasil destaca as milhares de mortes ocorridas e as que estão por vir causadas pela droga, mas deixa no cinzeiro o tratamento precário que o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece a quem decidiu, a duras penas, dizer adeus às tragadas da morte.
A cada seis segundos, o cigarro suga uma vida no mundo. O dado é da Organização Mundial de Saúde (OMS) que, este ano, traz um alerta: se medidas não forem tomadas, até 2030, 8 milhões de pessoas terão perdido a vida por causa do vício. No Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 24, 6 milhões de fumantes, o equivalente a 17, 2% da população acima de 15 anos. Minas Gerais está acima da média. Segundo o IBGE, o percentual de fumantes em Minas é de 17,6% da população com mais de 15 anos.
Mesmo com o alto índice, dos 853 municípios do Estado, apenas quatro têm programa efetivo para apoiar quem largou o vício: Juiz de Fora, Varginha, Pouso Alegre e Divinópolis. A capital, onde a estimativa é de que haja cerca de 600 mil tabagistas, não está nessa lista. Dos 147 postos de saúde de Belo Horizonte, apenas nove são destacados pela Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) como locais credenciados. No entanto, o pouco que se tem ainda é limitado.
?É um programa embrionário. Além das poucas unidades que o SUS oferece, às vezes, faltam remédios para os atendidos?, reconhece a presidente da Comissão de Controle do Tabagismo da Associação Médica de Minas Gerais, Maria das Graças Rodrigues de Oliveira. Também coordenadora do Programa do Controle de Tabagismo e Tuberculose da SMSA, ela ressalta que os nove postos atendem grupos de 10 a 15 pessoas. ?Por isso, há filas? .
Segundo Estela de Cássia Pereira, referência técnica de Promoção à Saúde/Tabagismo da Secretaria de Estado de Saúde, a procura é grande. ?O programa é regulamentado pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), do Ministério da Saúde, e funciona da seguinte forma: para ser credenciado, o posto tem de estar capacitado, com equipe preparada para atuar, com médicos, psicólogos e farmacêuticos. Além disso, não pode ter funcionários fumantes. O tratamento dura um ano e meio e são quatro seções em grupo, trimestralmente?, destaca.
Mas, na prática, é diferente. Segundo Estela Pereira, como faltam médicos e não há psicólogo na rede do Programa Saúde da Família (PSF), que é a equipe capacitada, qualquer outro profissional de curso superior pode atuar nessa frente. ?É trabalhada a abordagem cognitiva comportamental. Na ausência de um psicólogo, pode ser um assistente social, um dentista ou fisioterapeuta. A medicação pode faltar, porque o estado é muito grande e a entrega ocorre com morosidade, podendo demorar até 45 dias. O grupo a ser tratado só começa a ser atendido quando chegam os medicamentos?.
A técnica reconhece que são poucos os municípios que têm o programa efetivo. ?Mas há 12 cidades em processo de regulamentação?, diz, revelando que a situação foi levada à Comissão Intergestores Bipartite (CIB) para que o Estado passe a regulamentar o programa. ?O tabagismo é um problema de saúde pública e é preciso que se torne uma política estadual para que os gestores abracem a causa. Não adianta capacitarmos os 853 municípios se os gestores não o querem?, diz. No entanto, o Inca, do Ministério da Saúde, informa que o projeto não é de responsabilidade do ministério, mas do Estado.

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