O elevado número de documentos estudantis apresentados na compra de meia-entrada da tradicional Festa Nacional do Milho (Fenamilho), em Patos de Minas, no Alto Paranaíba, levantou a suspeita da Polícia Civil sobre um esquema de falsificação das carteirinhas, que acabou se revelando maior do que o esperado. Em uma operação chamada “Terceiro Grau”, a corporação localizou nessa terça-feira (15) nomes de 24.336 falsos estudantes, que teriam conseguido documentos inválidos de diversas instituições de ensino, como PUC e USP. Cinco pessoas foram detidas, e um dos envolvidos seria ligado à União Nacional dos Estudantes (UNE).

De acordo a Polícia Civil, foram cumpridos três mandados de busca e apreensão nas residências de pessoas identificadas como agenciadores – elas intermediavam o comércio dos documentos. Com base nas informações repassadas, a polícia chegou a dois estabelecimentos onde as carteirinhas eram falsificadas de fato.

A corporação contabilizou, inicialmente, 1.147 casos de adulteração de documentos estudantis. No entanto, em um computador apreendido, foram localizados nomes completos, RGs, datas de nascimento e supostas instituições de ensino de 24.336 falsos estudantes. Além disso, foram apreendidas duas impressoras e mais 754 carteiras em branco.

“A gente não consegue identificar se são todos daqui, mas acredita que eles prestavam o serviço pela internet. Isso está sendo investigado”, disse o delegado Felipe Colombari. Segundo o policial, os falsificadores cobravam de R$ 25 a R$ 30 por documento.

Cinco pessoas, duas mulheres e três homens, foram detidas e liberadas após prestarem depoimento. Uma delas teria autorização da UNE para emitir carteirinhas para estudantes, mas estaria distribuindo o documento sem critério.

A UNE informou que a falsificação de carteiras estudantis prejudica os estabelecimentos que oferecem meia-entrada e os estudantes que têm esse benefício assegurado por lei. Afirmou ainda que trabalha “para que o documento seja seguro e confiável” e que a informação de que um dos envolvidos seria integrante da UNE “causa perplexidade” e contraria os objetivos da entidade.

Conforme o delegado, a relação de fraudadores será encaminhada para a prefeitura, para as instituições de ensino e também para o Sindicato de Produtores Rurais de Patos de Minas. “Atitudes como essa encarecem ingressos de eventos para o lazer e passagens de transporte público. Alguém sempre paga a conta”, afirmou.

O presidente da União Colegial de Minas, representante da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) no Estado, Glauberth Reis, disse que os recursos do documento estudantil são o principal financiador da luta pela educação. “A partir do momento em que a pessoa faz com uma empresa falsa, o recurso deixa de ir para o fundo estudantil. Se o dinheiro é da carteirinha de estudante, tem que voltar para o estudante”, salientou.

Ingresso caro é justificativa

Quem frauda carteirinhas afirma que fez o documento em protesto ao preço abusivo dos ingressos. A comerciante M.O., 24, utiliza o método mais comum: completou com seus dados um modelo falso encontrado na internet e imprimiu em uma gráfica. “Queria ir ao Rock in Rio no ano passado, gastaria mais de R$ 3.000 para entrar todos os dias e acabei gastando R$ 1.500”, disse.

A aposentada I.M.A., 57, comprou por R$ 60 um documento feito de plástico: “Não parece cópia, é exatamente igual ao original. Muito caro ir ao cinema. Já pago muitos impostos”.

Há aqueles também que recorrem a métodos mais trabalhosos. O concurseiro L.A., 28, fez matrícula em um curso de informática só para conseguir o comprovante e, em seguida, cancelou. “Acho um absurdo cobrarem tão caro pela entrada inteira”, criticou.

Crime. Por protesto ou não, o fato é que falsificar documentos para obter vantagens é crime. Os envolvidos podem responder pelos crimes de falsidade ideológica e material, uso de documento falso e estelionato.

A pena é de um a cinco anos. De acordo com o especialista em direito penal Marcos Antônio Souza Santos, a punição é a mesma para quem compra ou vende os documentos falsos. Segundo ele, se a carteirinha for de faculdade pública, a pena é maior: dois a seis anos de reclusão.

 Venda de carteirinhas é feita também pelo Mercado Livre

É possível comprar uma carteirinha estudantil pela internet. A reportagem de O Tempo encontrou vendedores no site Mercado Livre e uma explicação de como a venda pode ser feita no YouTube.

Os anúncios afirmam que podem ser produzidos documentos de ao menos 120 instituições de ensino. Na foto de ilustração, um dos criminosos oferece, por exemplo, carteira de estudante da Universidade de São Paulo (USP). O valor para falsificar o documento estudantil pela internet varia de R$ 20 a R$ 74. O pagamento pode ser feito em parcelas (no cartão de crédito) ou via boleto. Segundo os anúncios, o envio é feito para todo o Brasil.

O Mercado Livre e o YouTube foram procurados na noite desta terça-feira, mas ninguém foi encontrado para falar.

Quem tem direito

 Alunos regularmente matriculados nos níveis e nas modalidades de educação e ensino previstos na Lei 9.394/1996: infantil, fundamental, médio, técnico, superior e de pós-graduação.

Rigor

Para evitar fraudes, a lei federal 12.933, de 2013, determina que os documentos tenham QR Code, código que permite o acesso de informações dos estudantes, como a instituição de ensino.

(Foto: divulgação Polícia Civil)

COMPATILHAR: