Vinte e cinco anos depois de ser vítima de agressão, a farmacêutica Maria da Penha, que dá nome à lei que endureceu as penas para quem pratica violência doméstica, deverá receber, nesta segunda-feira (7), a indenização de R$ 60 mil do governo do Ceará. A informação é da Agência Brasil.
Em 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil por negligência e omissão pela demora de 19 anos para punir o ex-marido de Penha e recomendou o pagamento de indenização à vítima.
O ex-marido foi condenado por atirar nas costas de Penha, deixando-a paraplégica em 1983 e, depois, por tentar matá-la eletrocutada. Ele foi preso em 2003 e já está em liberdade.

Maria da Penha

Em maio de 1983, Maria da Penha dormia quando o então marido, o professor universitário colombiano Marco Antônio Heredia Viveros, deu um tiro em suas costas. O pai de suas três filhas, na época com idades entre 2 e 6 anos, simulou um assalto. A biofarmacêutica com mestrado pela USP ficou paraplégica. Após quatro meses no hospital, ao voltar para casa, em Recife, nova tentativa de assassinato. Viveros tentou eletrocutá-la. "Só então a farsa do assalto foi descoberta. Conto minha história para que mulheres agredidas não se envergonhem de buscar ajuda nas delegacies da mulher e em casas de apoio", diz ela, que viaja pelo Brasil dando palestras e cobrando de governos medidas para acabar com a violência contra a mulher.
Em 1998, passados 15 anos do crime, o agressor de Maria da Penha foi julgado e condenado duas vezes e em ambas saiu livre do fórum devido a recursos. Foi então que, em parceria com o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) e o Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), ela denunciou o caso à OEA. Em 2001, o órgão internacional condenou o Brasil pela omissão, tolerância e impunidade com que tratava os casos de violência doméstica e recomendou ações como mudar a legislação para coibir a violência contra a mulher e pagar reparação a Maria da Penha. "É um valor simbólico, muito menos do que gastei para recuperar um pouquinho da saúde. Mas demonstra uma preocupação internacional contra a impunidade", diz Maria da Penha. Viveros só foi preso em 2002, graças às pressões internacionais. A pena: dez anos – menos de dois cumpridos em regime fechado.
Uma em cada cinco brasileiras afirma já ter sido vítima de violência, sendo o principal agressor o marido ou parceiro (dado da Fundação Perseu Abramo). Só 40% denunciam o agressor, aponta pesquisa do Data-Senado de 2006. Naquele ano, foi aprovada a Lei Maria da Penha, que pune com mais rigidez os agressores. Autora do livro SOBREVIVI… POSSO CONTAR (edição própria, esgotada), ela cita a frase de Martin Luther King para emblemar sua luta: "O que me preocupa não é o grito dos violentos, mas o silêncio dos bons".

A Lei

A Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, ou ?Lei Maria da Penha?, foi sancionada no dia 07 de agosto de 2006 pelo presidente Lula. Além de endurecer o tratamento e a pena imposta aos agressores, a lei reconhece, de forma inédita, que a violência contra a mulher pode ocorrer entre pessoas do mesmo sexo, em relacionamentos homossexuais, e em quaisquer casos onde haja vínculos afetivos entre a vítima e o agressor, não importado se moram juntos.
Os agressores deixarão de receber penas consideradas brandas em relação aos danos causados, como o pagamento de multas e cestas básicas. Agora o processo, o julgamento e a execução das causas criminais e cíveis, decorrentes da violência contra a mulher, seguirão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil, e também do Estatuto da Criança e do Adolescente, e do Estatuto do Idoso, quando convier. É a primeira vez que o país conta com uma Lei específica sobre a violência contra a mulher que estabelece quais são estas formas de violência (físicas, psicológicas, sexuais, patrimoniais e morais).
O Projeto de Lei de Conversão (PLC) 37/2006 é o resultado final de um projeto enviado pela ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire, ao Congresso Nacional em 25 de novembro de 2004. Fruto de um longo processo de elaboração a ?Lei Maria da Penha? leva este nome em homenagem à Maria da Penha Maia.
A nova Lei reconhece a gravidade dos casos de violência doméstica, e retira dos juizados especiais criminais (que julgam crimes de menor potencial ofensivo) a competência para julgá-los. Em artigo publicado em 2003, a advogada Carmem Campos apontava os vários déficits desta prática jurídica, que, na maioria dos casos, gerava arquivamento massivo dos processos, insatisfação das vítimas, e banalização da violência doméstica.
Deverão ser criados juizados especiais específicos para cuidar dos casos de violência contra a mulher, com competência para resolver não apenas as questões criminais, mas também as cíveis, relativas às questões do direito de família – como a separação, pensões, divisão dos bens comuns, e a guarda dos filhos.

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